terça-feira, 27 de setembro de 2011

Mais Teste, Mais Qualidade


O software desenvolvido no BB sempre foi, reconhecidamente, de alto nível. Nos últimos meses demos um salto de qualidade ainda maior. Os testes, anteriormente realizados quase que exclusivamente pelos desenvolvedores - e com muita competência, diga-se de passagem - passaram a ter uma abordagem mais formal, em conformidade com as últimas tendências do mercado. Num trabalho conjunto de diversas áreas - GovTI/PDABB (normatização), gerências de construção (testes unitário e de integração), Gtest (testes de sistema, funcionais e não-funcionais) e área de negócio (testes de aceitação) - em pouco tempo atingimos um grau de excelência comparável às organizações de TI mais maduras do mercado.

É importante destacar que a atuação de equipes dedicadas aos testes não substitui as verificações realizadas pelo desenvolvedor, e sim adicionam um novo esforço de qualidade, após a entrega do código e antes da aceitação do gestor, em consonância com diversas normas de referência e padrões, como a NBR ISO/IEC 12207 e 15504 (5), ISO/IEC 14764 e MPS.Br.

Obviamente, o aumento na complexidade do processo implica um maior custo. No entanto, isso passa a valer à pena a partir do momento em que os erros são identificados o mais cedo possível, reduzindo o custo de correção. Outro aspecto fundamental é o foco no reuso. Dentre os artefatos definidos para o processo - Plano, Scripts, Evidências e Relatório Final - os roteiros irão compor o "enxoval" da aplicação, enquanto os demais artefatos documentam a intervenção realizada. Os RET – Roteiros de Execução de Teste – elaborados são reutilizados quando de novas alterações no sistema, ou mesmo quando se fazem necessários testes de regressão.

A Gtest – Gerência de Teste, Homologação e Liberação – definiu uma série de indicadores destinados a acompanhar e refinar os testes, além da aplicação de um questionário de satisfação aos intervenientes dos projetos concluídos. A análise criteriosa dos números apurados tem se mostrado extremamente útil. Dentre os cerca de 10 indicadores acompanhados, talvez o que melhor expressa o valor que o teste vem agregando aos aplicativos desenvolvidos é o DDR - Densidade de Defeitos Residuais. Nele, relacionam-se os defeitos encontrados nos testes de aceitação pela área de negócios àqueles identificados nos testes de sistema.

A busca contínua de melhoria do processo levou ainda à especialização de papeis, resultando em otimização de recursos, ganho de escala e melhor aproveitamento do perfil de cada profissional de teste, com conseqüente aumento na motivação.

Mais uma vez a TI do BB sai na frente e se torna referência. Mas não paramos por aí. O projeto BB 2.0 é uma oportunidade de avançarmos ainda mais. Vamos mostrar que podemos ser ágeis, dinâmicos, sem abrir mão de processos e padrões. O SOA – Arquitetura Orientada a Serviços - impõe algumas mudanças no processo de teste. Aqueles realizados pelo próprio codificador têm especificidades relacionadas à própria arquitetura, e são parcialmente providos pelas ferramentas de desenvolvimento utilizadas. A partir daí, o software segue para os testes de sistema e aceitação, que têm que ser estruturados com base em novos insumos, um pouco diferentes daqueles a que estamos acostumados. Com certeza, a Ditec irá mostrar sua força em mais esse desafio.

A Copa e o Banco


O assunto do momento é, sem dúvida, a Copa do Mundo. Passeando pelos inúmeros corredores do Sede IV, já se vê muita mobilização. E não deve ser diferente em outros prédios do Banco. É o pessoal se cotizando para a compra de TVs, instalação de bandeirolas, organização de bolões e, como não poderia deixar de ser, grupos de discussão com o assunto de sempre: críticas à convocação do Dunga, o único brasileiro a não perceber que, num meio-de-campo repleto de Josués e Klébersons, não dava para prescindir de Ganso e Ronaldinho Gaúcho. Agora, está tudo nas mãos – ou nos pés – do filho do Gama. De todos os convocados para o principal setor da equipe, somente Kaká tem poder de criação, apesar de não atravessar, no momento, sua melhor forma física e técnica. De qualquer maneira, vamos torcer!

Mas, para não ficarmos só no lugar-comum, vamos resgatar algumas curiosidades sobre o grandioso evento que está se aproximando:

• alguns jornalistas espanhóis consideram a ida de Ronaldinho Gaúcho para o Milan fundamental para a ascensão do futebol de Lionel Messi, que promete ser a maior estrela da Copa. É que o brasileiro vivia nas baladas, e levava junto boa parte do time catalão...

• há 52 anos, o espírito do jogador brasileiro não era lá muito diferente. Uma das preocupações da comissão técnica na copa da Suécia era isolar os atletas das belas loiras escandinavas. Mas a seleção tinha Mané, famoso por seus dribles... e meses depois nascia Ulf Lindberg.

• no dia 30 de junho, um dia após o Brasil massacrar os donos da casa na final da copa por 5 a 2, um grupo de jogadores passeia pelas ruas geladas de Estocolmo e se depara com o mulato Moacir – meia do Flamengo, que não chegou a jogar nenhuma partida – abraçado com uma loira lindíssima. Antes que alguém dissesse qualquer coisa, ele se adianta, esbaforido: “Não me chamem de Moacir, pelo amor de Deus! Eu sou o Pelé! Eu sou o Pelé!”

• na copa de 78, França e Hungria se enfrentaram na última rodada já eliminadas, num grupo que também tinha Argentina e Itália. No entanto, as duas seleções entram em campo de camisas brancas, e ninguém tinha um segundo uniforme, para desespero do árbitro, o sr. Arnaldo César “a regra é clara” Coelho. Depois de muita polêmica, a França jogou – e venceu por 3x1 – usando um horroroso uniforme listrado em verde e branco do Kimberley, um pequeno clube de Mar del Plata.

• Johann Cruyff, estrela maior da “laranja mecânica” na Alemanha/74, usava uma camisa diferenciada do resto do time. Patrocinado pela Puma, Cruyff se recusou a usar as três listras que caracterizavam a concorrente Adidas. Seu uniforme tinha apenas duas. Se não fosse por esse detalhe, o camisa 14 não teria entrado em campo e levado sua seleção ao vice-campeonato mundial. Puma e Adidas, aliás, nasceram de uma briga entre dois irmãos – Rudi e Adi Dassler – na pequena cidade alemã de Herzogenaurach, há mais de 60 anos. Isso foi em 1947. Onze anos antes, Jesse Owens, o negro norte-americano que humilhou Hitler ganhando quatro medalhas de ouro nas Olimpíadas de Berlim, calçava sapatilhas Gebrüder, a empresa que daria origem às duas gigantes, pertencente aos irmãos Dassler... nazistas ferrenhos.

• Essa última não diz respeito diretamente à copa, mas à maior rivalidade do futebol mundial, Brasil e Argentina. E é bem recente. Quartas de final da Taça Libertadores da América. Com um gol no finalzinho, o Inter de Porto Alegre eliminou o Estudiantes, atual campeão. Como sempre ocorre ao perderem para os “macaquitos”, os portenhos perderam também a compostura. No meio do quebra-pau, Lauro, goleiro reserva do Inter, dá um cascudo no enjoado zagueiro Desábato. Meio atordoado, o grandalhão se vira e mete a porrada no outro goleiro do Inter... o também argentino Abbondanziéri. Grande Lauro!!!

O outro lado do processo seletivo


Chegara o grande dia. Após a distribuição da prova e as explicações de praxe, o silêncio. Éramos sete na sala e até chegarmos ali foram muitas horas de trabalho para todos.

Os quatro da comissão de seleção ralaram muito, até altas horas, elaborando a aferição técnica e as questões comportamentais que, no caso da nossa concorrência, realizar-se-iam num único dia. Uma semana antes, trabalho concluído e todo o material lacrado e guardado a sete chaves. Estávamos orgulhosos do resultado.

Os três candidatos não ficaram atrás em termos de dedicação, e não podia ser diferente. Estudaram muito, a partir das competências essenciais e desejáveis, constantes do documento-base da seleção. Chegar até ali já foi uma grande vitória. Mas o objetivo, lógico, era a tão sonhada promoção.

Tudo caminhava bem, havíamos construído um processo consistente, que avaliaria os candidatos com isenção e critério. Os três analistas, cabeça baixa, concentração total na prova, eram da minha equipe (eu conhecia a competência de cada um, mas precisava avaliá-los apenas por aquele dia), aquele momento era importantíssimo na carreira de cada um deles, mas somente um sairia dali com seu “upgrade”. Os demais sairiam dali com suas expectativas frustradas, e isso me entristecia, eu já sofria por antecipação, afinal, eu sabia o quanto eles batalharam para chegar até ali. Duas horas intermináveis.

Intervalo. No corredor, encontro o Serjão, figuraça, liderança não hierárquica que participava de outro processo, o qual tive o grande prazer de conhecer no curso de entrevista de seleção (aliás, se algum headhunter houvesse presenciado sua atuação na dinâmica de grupo, “contracenando” com o Piana, certamente a Ditec o teria perdido para a Rede Globo). Pois bem, o Serjão, ao saber o motivo do meu baixo astral, fez o diagnóstico:

– É, xará, empatia às vezes machuca...

No quebra-gelo, eu havia ressaltado – e estava sendo absolutamente sincero – que, ao final do dia, todos os sete sairíamos daquela sala melhores, com um grande aprendizado. Acho que foi o que ocorreu. E indo além, acredito que toda a Ditec sai dessa primeira onda do processo seletivo engrandecida.

Aos promovidos, parabéns! Aos que não conseguiram dessa vez, bola pra frente! Vem aí a segunda onda, e muitas outras oportunidades. A Tecnologia sempre estará de portas abertas aos bons profissionais!

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Meu filho, você não merece nada

Até hoje, só havia publicado no blog trabalhos de minha autoria. Abro uma honrosa exceção para o texto a seguir, da jornalista Eliane Brum (revistaepoca.globo.com).

Ao conviver com os bem mais jovens, com aqueles que se tornaram adultos há pouco e com aqueles que estão tateando para virar gente grande, percebo que estamos diante da geração mais preparada – e, ao mesmo tempo, da mais despreparada. Preparada do ponto de vista das habilidades, despreparada porque não sabe lidar com frustrações. Preparada porque é capaz de usar as ferramentas da tecnologia, despreparada porque despreza o esforço. Preparada porque conhece o mundo em viagens protegidas, despreparada porque desconhece a fragilidade da matéria da vida. E por tudo isso sofre, sofre muito, porque foi ensinada a acreditar que nasceu com o patrimônio da felicidade. E não foi ensinada a criar a partir da dor.

Há uma geração de classe média que estudou em bons colégios, é fluente em outras línguas, viajou para o exterior e teve acesso à cultura e à tecnologia. Uma geração que teve muito mais do que seus pais. Ao mesmo tempo, cresceu com a ilusão de que a vida é fácil. Ou que já nascem prontos – bastaria apenas que o mundo reconhecesse a sua genialidade.

Tenho me deparado com jovens que esperam ter no mercado de trabalho uma continuação de suas casas – onde o chefe seria um pai ou uma mãe complacente, que tudo concede. Foram ensinados a pensar que merecem, seja lá o que for que queiram. E quando isso não acontece – porque obviamente não acontece – sentem-se traídos, revoltam-se com a “injustiça” e boa parte se emburra e desiste.

Como esses estreantes na vida adulta foram crianças e adolescentes que ganharam tudo, sem ter de lutar por quase nada de relevante, desconhecem que a vida é construção – e para conquistar um espaço no mundo é preciso ralar muito. Com ética e honestidade – e não a cotoveladas ou aos gritos. Como seus pais não conseguiram dizer, é o mundo que anuncia a eles uma nova não lá muito animadora: viver é para os insistentes.

Por que boa parte dessa nova geração é assim? Penso que este é um questionamento importante para quem está educando uma criança ou um adolescente hoje. Nossa época tem sido marcada pela ilusão de que a felicidade é uma espécie de direito. E tenho testemunhado a angústia de muitos pais para garantir que os filhos sejam “felizes”. Pais que fazem malabarismos para dar tudo aos filhos e protegê-los de todos os perrengues – sem esperar nenhuma responsabilização nem reciprocidade.

É como se os filhos nascessem e imediatamente os pais já se tornassem devedores. Para estes, frustrar os filhos é sinônimo de fracasso pessoal. Mas é possível uma vida sem frustrações? Não é importante que os filhos compreendam como parte do processo educativo duas premissas básicas do viver, a frustração e o esforço? Ou a falta e a busca, duas faces de um mesmo movimento? Existe alguém que viva sem se confrontar dia após dia com os limites tanto de sua condição humana como de suas capacidades individuais?

Nossa classe média parece desprezar o esforço. Prefere a genialidade. O valor está no dom, naquilo que já nasce pronto. Dizer que “fulano é esforçado” é quase uma ofensa. Ter de dar duro para conquistar algo parece já vir assinalado com o carimbo de perdedor. Bacana é o cara que não estudou, passou a noite na balada e foi aprovado no vestibular de Medicina. Este atesta a excelência dos genes de seus pais. Esforçar-se é, no máximo, coisa para os filhos da classe C, que ainda precisam assegurar seu lugar no país.

Da mesma forma que supostamente seria possível construir um lugar sem esforço, existe a crença não menos fantasiosa de que é possível viver sem sofrer. De que as dores inerentes a toda vida são uma anomalia e, como percebo em muitos jovens, uma espécie de traição ao futuro que deveria estar garantido. Pais e filhos têm pagado caro pela crença de que a felicidade é um direito. E a frustração um fracasso. Talvez aí esteja uma pista para compreender a geração do “eu mereço”.

Basta andar por esse mundo para testemunhar o rosto de espanto e de mágoa de jovens ao descobrir que a vida não é como os pais tinham lhes prometido. Expressão que logo muda para o emburramento. E o pior é que sofrem terrivelmente. Porque possuem muitas habilidades e ferramentas, mas não têm o menor preparo para lidar com a dor e as decepções. Nem imaginam que viver é também ter de aceitar limitações – e que ninguém, por mais brilhante que seja, consegue tudo o que quer.

A questão, como poderia formular o filósofo Garrincha, é: “Estes pais e estes filhos combinaram com a vida que seria fácil”? É no passar dos dias que a conta não fecha e o projeto construído sobre fumaça desaparece deixando nenhum chão. Ninguém descobre que viver é complicado quando cresce ou deveria crescer – este momento é apenas quando a condição humana, frágil e falha, começa a se explicitar no confronto com os muros da realidade. Desde sempre sofremos. E mais vamos sofrer se não temos espaço nem mesmo para falar da tristeza e da confusão.

Me parece que é isso que tem acontecido em muitas famílias por aí: se a felicidade é um imperativo, o item principal do pacote completo que os pais supostamente teriam de garantir aos filhos para serem considerados bem sucedidos, como falar de dor, de medo e da sensação de se sentir desencaixado? Não há espaço para nada que seja da vida, que pertença aos espasmos de crescer duvidando de seu lugar no mundo, porque isso seria um reconhecimento da falência do projeto familiar construído sobre a ilusão da felicidade e da completude.

Quando o que não pode ser dito vira sintoma – já que ninguém está disposto a escutar, porque escutar significaria rever escolhas e reconhecer equívocos – o mais fácil é calar. E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.

Se os filhos têm o direito de ser felizes simplesmente porque existem – e aos pais caberia garantir esse direito – que tipo de relação pais e filhos podem ter? Como seria possível estabelecer um vínculo genuíno se o sofrimento, o medo e as dúvidas estão previamente fora dele? Se a relação está construída sobre uma ilusão, só é possível fingir.

Aos filhos cabe fingir felicidade – e, como não conseguem, passam a exigir cada vez mais de tudo, especialmente coisas materiais, já que estas são as mais fáceis de alcançar – e aos pais cabe fingir ter a possibilidade de garantir a felicidade, o que sabem intimamente que é uma mentira porque a sentem na própria pele dia após dia. É pelos objetos de consumo que a novela familiar tem se desenrolado, onde os pais fazem de conta que dão o que ninguém pode dar, e os filhos simulam receber o que só eles podem buscar. E por isso logo é preciso criar uma nova demanda para manter o jogo funcionando.

O resultado disso é pais e filhos angustiados, que vão conviver uma vida inteira, mas se desconhecem. E, portanto, estão perdendo uma grande chance. Todos sofrem muito nesse teatro de desencontros anunciados. E mais sofrem porque precisam fingir que existe uma vida em que se pode tudo. E acreditar que se pode tudo é o atalho mais rápido para alcançar não a frustração que move, mas aquela que paralisa.

Quando converso com esses jovens no parapeito da vida adulta, com suas imensas possibilidades e riscos tão grandiosos quanto, percebo que precisam muito de realidade. Com tudo o que a realidade é. Sim, assumir a narrativa da própria vida é para quem tem coragem. Não é complicado porque você vai ter competidores com habilidades iguais ou superiores a sua, mas porque se tornar aquilo que se é, buscar a própria voz, é escolher um percurso pontilhado de desvios e sem nenhuma certeza de chegada. É viver com dúvidas e ter de responder pelas próprias escolhas. Mas é nesse movimento que a gente vira gente grande.

Seria muito bacana que os pais de hoje entendessem que tão importante quanto uma boa escola ou um curso de línguas ou um Ipad é dizer de vez em quando: “Te vira, meu filho. Você sempre poderá contar comigo, mas essa briga é tua”. Assim como sentar para jantar e falar da vida como ela é: “Olha, meu dia foi difícil” ou “Estou com dúvidas, estou com medo, estou confuso” ou “Não sei o que fazer, mas estou tentando descobrir”. Porque fingir que está tudo bem e que tudo pode significa dizer ao seu filho que você não confia nele nem o respeita, já que o trata como um imbecil, incapaz de compreender a matéria da existência. É tão ruim quanto ligar a TV em volume alto o suficiente para que nada que ameace o frágil equilíbrio doméstico possa ser dito.

Agora, se os pais mentiram que a felicidade é um direito e seu filho merece tudo simplesmente por existir, paciência. De nada vai adiantar choramingar ou emburrar ao descobrir que vai ter de conquistar seu espaço no mundo sem nenhuma garantia. O melhor a fazer é ter a coragem de escolher. Seja a escolha de lutar pelo seu desejo – ou para descobri-lo –, seja a de abrir mão dele. E não culpar ninguém porque eventualmente não deu certo, porque com certeza vai dar errado muitas vezes. Ou transferir para o outro a responsabilidade pela sua desistência.

Crescer é compreender que o fato de a vida ser falta não a torna menor. Sim, a vida é insuficiente. Mas é o que temos. E é melhor não perder tempo se sentindo injustiçado porque um dia ela acaba.

sábado, 10 de setembro de 2011

Copa de Lata



O Egito é a África branca, árabe, do norte, do bom futebol. Tricampeões da copa africana de nações, os egípcios têm a melhor seleção, mas por um desastre – derrota num jogo extra contra a Argélia – estão acompanhando a Copa do Mundo de longe, no outro extremo do continente.

Mas alguns habitantes da própria África do Sul estão tão ou mais distantes da grande festa do futebol. São os moradores da Blikkiesdorp – “cidade de lata”, em africâner.

O autointitulado “governo de integração”, formado em grande parte por aqueles que ajudaram a acabar com o apartheid racial, oficialmente extinto na década de 90, implementou uma nova forma de apartheid, agora social, com um único objetivo: esconder do mundo a pobreza de uma das sedes da copa.

A população “indesejável” de Cape Town (Cidade do Cabo) – moradores de rua, imigrantes pobres, portadores do vírus HIV – foi confinada num assentamento, localizado a 20 km da metrópole, formado por milhares de barracos de zinco, que potencializam o frio no inverno e o calor no verão. Estima-se que cerca de 10 mil pessoas vivam no local atualmente, que é totalmente cercado por arame farpado e cujo único acesso é rigidamente controlado por policiais.

Talvez pela triste história dos excluídos sul-africanos, elegi o Paraguai como minha zebra favorita. Explico. Há cerca de 150 anos, o país era uma potência econômica na América do Sul, e foi sufocado por Brasil, Argentina e Uruguai – se não bastasse, ainda apoiados pela Inglaterra – na Guerra do Paraguai. De lá para cá, o país nunca mais conseguiu se reerguer. Dentre todos os países da Copa, seu IDH só é superior ao dos africanos e ao de Honduras.

Injustiças nunca deixarão de ocorrer. No entanto, pelo menos, mantenhamos o inconformismo... e a isenção. Há pouco tempo, todos crucificamos o decadente Henry, que dominou a bola no braço duas vezes, antes de dar o passe para o gol que classificou a (mais decadente ainda) França para a Copa, na repescagem contra a Irlanda. Esta semana tivemos algo “fabulosamente” parecido, só que a nosso favor. Nenhuma manifestação de indignação.

2009, Auxerre x Olympique, pelo campeonato francês. O atacante Koné, do Olympique, recebe cartão vermelho. Valter Birsa, meia do Auxerre, se dirige ao árbitro e o convence a reverter a expulsão, por considerá-la injusta, numa inédita demonstração de fair play.

Imaginem se Luís Fabiano faz o mesmo, assume a irregularidade e pede ao Sr. Stephane Lannoy que anule o seu tento. Talvez isso nem fizesse falta à trajetória do Brasil. O Fabuloso escreveria para sempre o seu nome entre os grandes do futebol mundial. E seria um golaço, hein?

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Caxambu... e o Paulão

Quando meu amigo Alencar soube que eu estava passando alguns dias no circuito das águas - sul de Minas – foi logo me sacaneando:

- vocês devem ser disparadamente as pessoas mais jovens daí!

Pra não perder o embalo, completei:

- com certeza, seguidos de perto pelo Niemeyer (103 anos de idade, e cheio de planos para o futuro. Esse é o Jaspion!)

Mas ali tudo é show: a rede hoteleira, a hospitalidade, boa comida... e a água, claro. De qualquer forma, essa coisa de destino da velharada é um péssimo marketing para a região, e meio que espanta o turismo.

Das cidades do circuito, São Lourenço é a “metrópole” e Cambuquira a mais decadente. Preferimos Caxambu, um meio termo. No delicioso expresso que tomávamos religiosamente todo fim de tarde no Café Avenida, na esquina mais movimentada da cidade – apenas uma força de expressão, obviamente – fomos conhecendo um pouco o dia-a-dia do caxambuense. Foi surpresa constatar que o estresse já chegou por lá. De uma forma bem particular, é verdade. Mas que chegou, chegou. O galo do Lázaro foi recolhido ao canil da prefeitura, pois seu cacarejar de madrugada estava incomodando dona Marieta, uma velhinha que mora nas proximidades do Parque das Águas.

Mas a figuraça da cidade, o Indiana Jones do pedaço, é, sem dúvida, o Paulão, garçom de um dos hotéis da cidade, e dono de um boteco com apenas duas mesas, que serve os melhores tira-gostos da região.

Já no primeiro contato, ao tomarmos o café da manhã no hotel, Paulão foi logo nos municiando com material para escrevermos algo sobre ele.

Primeiramente, chegou de cara emburrada, colocou dois potinhos de manteiga na mesa, depois mais dois, e em seguida outros dois.

Eu estava achando aquilo divertido, mas como já começava a faltar espaço na mesa, resolvi puxar assunto, para ver se ele esquecia aquele leva-e-traz de manteiga, e seu crachá me chamou atenção. Lá estava escrito, em letras miúdas: Francisco R. Vieira. E em letras maiores: Paulão, Garçom. Perguntei:

- Seu nome é Paulo ou é Francisco?

Quando ele respondeu, achei que estava me sacaneando, mas era a pura verdade:

- Minha mãe quis me resgistrar como Francisco Paulo, mas o tabelião falou que ficava muito grande, e iria colocar só Francisco. Aí ela disse que tudo bem, mas que mesmo assim iria me chamar de Paulo.

Ao ouvir essa história inacreditável, comentei com ironia que esse tabelião tinha mesmo foco no cliente. Um casal paulista, que tomava café na mesa ao lado, riu da minha observação, mas o Paulão não achou a menor graça, e continuou com a mesma cara de puto do início.

Muitos dias e muitas histórias depois ele foi se soltando. Tenho até a impressão de que no dia em que fomos embora ele chegou a sorrir, mas posso ter me enganado.

Sempre que pedíamos alguma dica sobre qual o melhor lugar para comprar doce, café, ou uma coisa qualquer, Paulão invariavelmente orientava: Vá em tal lugar e diga que foi o Paulão que indicou. Quando isso acontecia, no dia seguinte eu sempre dizia pra ele:

- Pô, Paulão! Eu perguntei quanto era o café, e a moça falou dez reais. Quando eu disse que você tinha recomendado, ela aumentava: - É vinte! Das duas uma: ou você ganha comissão, ou ela esse povo tá chateado com você!

E invariavelmente o Paulão fechava ainda mais a cara.

Mas se quiser estressar mesmo o Paulão, pergunte a ele sobre o patrão, gerente do hotel. Aí o homem vira uma fera.

Bom, pra finalizar, se você estiver entre Minas, Rio e São Paulo, vale uma esticada em Caxambu. E uma parada obrigatória, claro, no bar do Paulão, no qual trabalha toda a família. Além das mil e uma histórias, as caipiroscas de frutas vermelhas, lima e mexerica com maracujá que ele prepara são imbatíveis. Pra acompanhar, os salgadinhos preparados na hora pela dona Fátima. O bolinho de bacalhau, crocante pro fora e cremoso por dentro, é simplesmente imperdível.

Comer, Rezar, Corromper

Lá pela década de 80, aos 17 anos de idade, ainda morando em Fortaleza, meu irmão publicitário me arrumou um estágio numa estação de TV. Passei uns cinco anos nessa área.

No início, fazia edição eletrônica de matérias jornalísticas. Depois, trabalhei numa agência de propaganda, dirigindo comerciais para televisão.

Nessa época, surgiu a oportunidade de estudar cinema em Cuba, na universidade San Antonio de Los Baños. Foi quando me vi numa encruzilhada profissional.

Como quem tem tem medo, e ciente da minha total falta de talento, achei que passar dois anos comendo arroz com banana no Caribe não me traria grandes benefícios. Resultado: ao invés de embarcar na Cubana de Aviación rumo a Havana, acabei mesmo foi num busão da Itapemirim a caminho do sertão pernambucano. O mundo pode ter perdido um futuro Tarantino, mas a agência do BB no alto Pajeú ganhou o escriturário que procurava há meses.

Bom, mas porque estou contando tudo isso? Porque cinema continua sendo uma das minhas paixões.

Pra mim, um bom filme pode ser um Eisenstein do inicio do século XX, um clássico de Bergman, um Almodóvar, um Dogma 95, ou até mesmo um enlatado americano.

Depois do incêndio no Cine Academia, Brasília ficou meio restrita ao circuito comercial. De qualquer forma, tentei garimpar alguma coisa pelos shoppings da cidade. Apesar das referências pouco animadoras, fui ver Comer, Rezar, Amar. Só não vou dizer que meus piores pesadelos se confirmaram porque, para quem teve uma semana difícil, a película nos induz a um sono tranquilo e reparador.

Cheio de lugares-comuns, não adianta esperar que em algum momento surja algo que tire a história do previsível desfecho entre a chatíssima Julia Roberts e seu par, o excelente Javier Bardem e sua tripla nacionalidade: espanhol, brasileira e... paraguaia. Sim, porque seu personagem tupiniquim se mostrou mais falsificado que os DVDs à venda nos barzinhos candangos.

Mas é como diz aquele ditado impublicável: gosto todo mundo tem um, porque vários conhecidos adoraram aquela porcaria...

Decepcionado com essa primeira experiência, só encarei o segundo desafio porque havia prometido ao meu filho que o levaria para disputar à tapa, com centenas de cinéfilos ensandecidos, dois lugares na semana de estreia de Tropa de Elite 2.

E não é que valeu à pena? Eu havia gostado do primeiro, mas, como é de praxe, imaginava que a continuação seria apenas uma forma da dupla Padilha/Moura aproveitar o sucesso inicial para ganhar mais uns trocados.

Como diretor, José Padilha amadureceu. Em determinados momentos, a sensação de se tratar de um documentário é tão forte que fiquei imaginando o impacto do filme sobre o resultado das urnas no Rio de Janeiro, caso seu lançamento tivesse ocorrido antes do primeiro turno das eleições.

Falar sobre corrupção, de tão banal, tornou-se algo extremamente chato. O alvo óbvio são os políticos. Mas Padilha parece ter encontrado a fórmula – e aí reside um dos pontos fortes do filme – de demonstrar a corrupção congênita do ser humano, que se faz presente em todas as esferas da sociedade: na política, no trabalho, e mesmo nos círculos de amizade.

O que chega a causar náusea em determinados momentos é a percepção de que a estrutura da bandidagem se mostra muito mais abrangente do que a imaginada inicialmente. Suas formas de intimidação algumas vezes são sutis, mas geralmente são explícitas, ameaçadoras, o que leva a maioria das pessoas, mesmo as bem-intencionadas, à atitude mais prudente: a omissão. Algumas passagens do filme reafirmam isso, como, por exemplo, no marcante desfecho da reintegração do capitão André Matias ao BOPE.

No nosso dia-a-dia, invariavelmente, em algum momento nos deparamos com algum tipo de picaretagem. E a tendência é nos acomodarmos. É muito mais seguro. No máximo, fazemos um ou outro comentário com alguém mais próximo. Mas acredito que, de alguma forma, sempre há algo a ser feito. E é aí que devemos atuar. É a tal história: adoramos falar da dívida externa do país, mas não gostamos de comentar a conta que penduramos na padaria da esquina (se Brasília tivesse esquinas, claro).

Quem sabe, se houver mais indignação, se determinadas práticas forem menos aceitas, se formos menos permissivos no nosso cotidiano, talvez pequenas mudanças comecem a ocorrer e se transformem em algo maior. Quem sabe, o surrado bordão do primeiro Tropa - “Pede, para sair!! Pede para sair!!” - pode se tornar um grande coro nacional.

Pra terminar num clima mais light, tirando um pouco o tom amargo que tomou conta de mim na elaboração desse texto, lembrei de um fato pitoresco da minha fase pré-BB: na campanha política de 1986 (é, estou ficando velho…), um amigo – o publicitário paranaense Carlos Deyró – recebeu a encomenda de um jingle para um candidato (por sinal, corrupto até a alma, vim saber depois) e ele se dizia sem inspiração para compor. A música que enchia o saco na época era He-Man (coisas da Xuxa, isso há um quarto de século atrás!). Peguei um bloquinho de anotações, comecei a rabiscar uns chavões e, em menos de cinco minutos, tinha uma página inteira de bobagens escritas. De brincadeira, falei:

– Tá pronto!

Não é que ele levou a sério? Foi o primeiro free lancer da minha vida.

Essa semana, num happy hour da equipe, a pedidos, dei uma canja pra galera:

– “... Eu tenho a força, sou eleitooor, vamos amigos, em (nome omitido por razões óbvias) vamos votar!”…

Ganhei vários chopes, sob a promessa de nunca mais abrir a boca pra cantar aquilo...

Bola pra Frente, Fenômeno!

Saindo às pressas do colegiado da DITEC, André Seve me pede para escrever algo sobre a aposentadoria do Ronaldo. Vou tentar fazê-lo em 5 minutos, pois a correria é grande.

Nos últimos meses, o gorducho andou pisando na bola – às vezes literalmente.

Mas não é essa a imagem que devemos guardar do nosso inesquecível atacante, e sim a imensa alegria que ele nos proporcionou durante tantos anos, principalmente naquele 30 de junho de 2002.

Nesse dia, pouca gente prestou atenção ao último suspiro do grande Chico Xavier, já que do outro lado do planeta o filho pródigo da família Scolari trazia o penta da terra do sol nascente.

Ontem, Ronaldo anunciou sua aposentadoria. Para os torcedores, ele é um velho. Na realidade, aos 34 anos, é quase uma criança, com toda uma vida pela frente.

Ronaldo, muito obrigado pelos mais de 400 gols e pelos belos momentos que você nos proporcionou na sua dolorida trajetória, marcada por tantas contusões que impediram uma carreira ainda mais vitoriosa.

Bola para frente, Fenômeno!

São 9h57, gastei 6 minutos. Acho que não ficou tão ruim…